01 dezembro, 2008

Finais mais ou menos felizes*

"Detesto finais...
O melhor das coisas é não lhes conhecer o fim.
Acordar e não saber como vai ser o dia, adormecer e nem sonhar com quem se vai sonhar. Partir sozinha num fim de semana e encontrar companhia. Ficar em casa à noite e ouvir a campainha tocar. Deixar-me ir na vida, viver e deixar viver sem as grandes opções do plano. Não é tão fácil como entregar a existência a um esquema de vida cheio de programas e obrigações, mas é muito mais agradável, porque a vida está sempre á espreita, é só dar-lhe tempo e espaço.
Por isso é que os finais são horriveis. Fica o ar vazio, deixamos de ver ao longe, de repente apagam-se as luzes e a vida fecha-se aos nossos olhos. Depois do fim, vem a pergunta fatal E Agora? Dá vontade de ir à bruxa para ter uma ideia, mas resiste-se estoicamente, até porque as fadas também se enganam. Aproveita-se o tempo para ligar a velhos amigos, arrumar gavetas e deitar papeis fora, limpar a memória e deixar o coração de molho, em convalescença a carregar baterias.
Mas o pior são as despedidas. É sempre horrivel dizer adeus, mesmo que seja só até logo à noite.(...)
E depois dizer adeus não é fácil. (...) Nunca dizemos até já, a não ser que o reencontro seja daí a cinco minutos. Dizemos sempre adeus, ou na melhor das hipóteses até logo, porque logo se vê. Por isso é que os fins doem tanto. Porque além de acabarem ainda temos de nos despedir.
Não, não gosto de dizer adeus nem de ver o fim a nada, sobretudo se não lhe vi o principio. Prefiro dizer até um dia destes, mesmo que esse dia demore anos. Ou então, afastar-me sem uma palavra, e deixar no ar o mistério de não saber quando, como e porque é que nos voltamos a encontrar. Assim não sou eu que ponho fim ás coisas, mas as coisas que um dia acabarão, ou não, por si."
*Margarida Rebelo Pinto - "As crónicas da Margarida"

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